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Conhecendo "Amar", de Carlos Drummond de Andrade

Amar


Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, 
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o amar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho,
e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
- Carlos Drummond de Andrade



Vocabulário

expectante: que espera, observando; que está na expectativa
pérfidas: o mesmo que falso, desleal, traiçoeiro
tácito: silencioso; implícito; oculto


Interpretando o Texto:    


Primeira Estrofe: eu lírico questiona as possibilidades do ser diante do amor; por mais que o amor mude "amar e esquecer, / amar e malamar, / amar, desamar, amar?", ele é sua sina.

Segunda Estrofe: o ser é naturalmente amoroso e não tem escolha senão amar, como se fosse levado a isso; ama o novo, o velho, a desilusão e a própria possibilidade de amor.

Terceira Estrofe: eu lírico trata do amor às coisas simples, selvagens, imaginárias e reais (facilidade do homem em amar).

Quarta Estrofe: o amor nunca é suficiente, este é o destino dos homens: "amor sem conta, / distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas". Amar, se doar, se decepcionar e ir novamente à procura de amor.

Quinta Estrofe: "Amar a nossa falta mesma de amor", numa procura condenada ao fracasso por amor (essa carência nunca será preenchida).



Ficha Técnica:
Total de estrofes: 5 (3 sextilhas, 1 quintilha, 1 dístico)





Carlos Drummond de Andrade foi um dos grandes escritores do período do modernismo brasileiro. Nasceu em 31 de outubro de 1902, em Itabira do Mato Dentro (interior de Minas Gerais). Publicou seus primeiros trabalhos no Diário de Minas, em 1921. Apesar de ter se formado em Farmácia na Escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte, não exerceu a profissão, trabalhando como professor no Ginásio Sul-Americano de Itabira. Seu primeiro livro "Alguma Poesia" foi publicado em 1930, sendo precursor da chamada "poesia de 30". Drummond faleceu no Rio de Janeiro, no dia 17 de agosto de 1987.


*Definições das palavras do vocabulário retiradas da Infopédia (Dicionários Porto Editora) e do Dicionário Online de Português.

Amar por ausência, uma Leitura Interpretativa do Poema "Amar", de Carlos Drummond de Andrade. Disponível em: <http://www.filologia.org.br/pub_outras/sliit02/sliit02_110-112.html>

Biografias - Carlos Drummond de Andrade. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/carlos-drummond-de-andrade/>

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