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Conhecendo "Retrato do artista quando coisa", de Manoel de Barros



Retrato do artista quando coisa

A maior riqueza 
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto 
sou abastado.
Palavras que me aceitam 
como sou
- eu não aceito.
Não aguento ser apenas
um sujeito que abre
portas, que puxa
válvulas, que olha o
relógio, que compra pão
às 6 da tarde, que vai
lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai. Mas eu 
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o homem
usando borboletas.

- Manoel de Barros



Ficha Técnica:

Total de versos: 
21 ( versos livres e brancos )






Interpretando o Texto:


"Retrato do artista quando coisa" - podemos analisar o título do poema segundo dois viés: 1º) a representação de um artista enquanto executa sua arte (coisa como uma ação); 2º) processo de coisificação do homem (Retrato do artista "enquanto é coisa").
Logo no início do poema depreendemos que o eu lírico considera-se rico, uma vez que não atingiu a plenitude, já que alega que "A maior riqueza / do homem / é sua incompletude. / Nesse ponto / sou abastado.". Contrariando o senso comum que sempre está atrás de se sentir inteiriço, por meio de sua cara metade, aquela busca interminável por sucesso profissional, por felicidade, que os tornam completos.
O eu lírico continua seu raciocínio, alegando não gostar do que é previsível, socialmente aceito,  como os rótulos ("Palavras que me aceitam / como sou / - eu não aceito."). Seu desapreço se estende às rotinas e aos padrões que são esperados dele ou comuns para as demais pessoas. Neste ponto "Não aguento ser apenas / um sujeito que abre / portas, que puxa / válvulas, que olha o / relógio", nota-se uma semelhança com o filme "Tempos Modernos", de Charlie Chaplin, com a industrialização e a mecanização do tempo, resultando nessa coisificação do homem expresso no título do poema. O eu lírico prossegue alegando que não pode ser desta forma genérica, pois deseja ser diferente, múltiplo ("Perdoai. Mas eu / preciso ser Outros."). Encerra afirmando: "Eu penso / renovar o homem / usando borboletas.", expressando sua capacidade de inovar a partir da simplicidade; assim como a borboleta passa pela metamorfose, a poesia de Manoel de Barros é transformadora.

OBS: Vale ressaltar que o uso de versos sem métrica e rima se contrapõem aos padrões literários que durante anos foram impostos ao gênero lírico.




Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, no dia 19 de dezembro de 1916. Quando pequeno morou em Corumbá, até completar 13 anos e se mudar para Campo Grande. Formou-se bacharel em direito no Rio de Janeiro, mas dedicou sua vida à poesia. Foi membro da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras e recebeu vários prêmios literários, inclusive dois Jabutis. Faleceu aos 97 anos, em seu estado natal. Suas obras são mundialmente conhecidas, sendo um dos grandes poetas brasileiros da contemporaneidade. 



*Discuti esta obra com meu marido e algumas das interpretações expostas surgiram deste diálogo. 

Escritores - Manoel de Barros. Disponível em: <https://www.infoescola.com/escritores/manoel-de-barros/>

Manoel de Barros. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Manoel_de_Barros#Vida_pessoal>

GUTIERRE, Maria Madalena Borges. GONÇALVES, Larissa Muniz. TOMAZ, Regina Maura. Retrato do Artista Quando Coisa: Figuratividade e Sentido. Disponível em: <http://periodicos.unifacef.com.br/index.php/rel/article/view/1028>

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